Teologia Imprestável!

Nos últimos 30 dias tenho sido mais profundamente desafiada a transformar minha teologia em ações que realmente ajudem a estabelecer o Reino de Deus nesta terra. A teologia quando se torna "só discurso" é uma lástima, confunde e, em alguns casos, até enlouquece.

Primeiro pelo Congresso de Missão Empresarial que aconteceu no início do mês. Como sou empresária e meu objetivo de construir a Eagle Gestão de Ensino é todo focado na Missão, fui instruir-me sobre maneiras de colocar minha empresa ainda mais a serviço do Reino.

Patrick Lai e Bill Jobs me sacudiram bastante nesta conferência e me levaram a um questionamento interior importante: por que eu abandonei um velho hábito de orar pelas nações do mundo diariamente? De 2005 em diante, este hábito simplesmente saiu da minha rotina, assim, parei de fazer. Para minha alegria, o Operation World, que eu usava como livro de intercessão desde os anos 80 até 2005, está todo online, e interativo, com vídeos. Um primor.

Começar meu dia intercedendo pelo povo do Camboja mexeu minhas entranhas. Me fez sentir a dor deles, despertou a misericórdia, me fez arder de compaixão porque lembrei que eles sequer podem se dirigirem ao Pai pedindo por socorro porque simplesmente não sabem que o sacrifício de Jesus na cruz lhes concedeu esta possibilidade, de livre acesso ao Pai. Eles não tem acesso a tal informação.

Não consigo conceber uma Teologia que não me remove as entranhas em compaixão pelo que está oprimido, sem esperança, sem condições de mudança e melhoria.

Finalizando o mês, e completando um ano de um dia especial no meu calendário, que chamo "Dia de Graça" - 25 de abril, uma data significativa na minha caminhada de ativismo contemplativo, chegou uma confraternização de parte da equipe da  Conferência Batista Latino Americana pela paz. Conhecer tantos irmãos com as mesmas inquietações que eu, simplesmente completou a terapia de choque que o Papai estava fazendo comigo desde o início do mês. Ainda estou cambaleando com o fervor das ideias  sobre o Reino que vieram à tona nestas duas ocasiões. Elas estão saindo pelos poros, pouco a poco, e vão aparecendo por aí, onde vocês estão acostumados a ver minhas reflexões (Elos, Novos Diálogos, RIBLA, Estudos Bíblicos).

Por fim, A Palavra, a mesma que sempre me penetra até os pensamentos e decisões, me fez refletir sobre o papel do Teólogo na sociedade contemporânea. A gente sempre vê a Teologia como um conhecimento reflexivo e que conduz à reflexão, como filha da Filosofia que ela é. Mas hoje Hebreus me fez ver a Teologia com um novo olhar, compreendendo-a como o sacerdócio do conhecimento que temos da misericórdia divina. Explico.

Nos Profetas, os sacerdotes são acusados de fazerem o povo pecar  por mantê-los na ignorância sobre o conhecimento de Deus. O sacerdote era a pessoa procurada pelo povo para intermediar o processo de comunhão do povo com Deus. Para isso ele pedia por misericórdia e perdão para os pecados daquela gente. Os ritos dos sacrifícios nada mais são do que isto, a INTERCESSÃO. Da mesma forma, pessoas que acessam os teólogos o fazem para conhecer mais a Deus, para que este conhecimento sobre Deus os faça chegar mais próximos de Deus. Ocorre que, muitas vezes transferimos para os que nos ouvem, nossas próprias crises teológicas, e ao invés de aproximar as pessoas de Deus, nós as fazemos duvidar dele. Com isto prestamos um desserviço ao Reino. Devemos provocar questionamentos sim, é nosso papel também, mas a forma como o temos feito aproxima ou afasta as pessoas de Deus?

Não pude evitar que me viesse à mente a quantidade de tempo que perdemos construindo reflexões sobre Deus que EM NADA aproximam nossos ouvintes e leitores da pessoa de Deus. Que em nada cooperam para conhecê-lo mais, para apresentar-lhes Seu caráter, que em nada constroem uma visão de compaixão e misericórdia pelos oprimidos e perdidos, sem esperança, sem resgate, sem redenção.

De que me serve uma teologia que não é usada para fazer as pessoas conhecerem mais a Deus? Será que eu, em toda minha teologia, estou realmente interessada em conhecer este Deus de maneira mais profunda? De que me serve um conhecimento de Deus que não me emociona, que não me comove, que não me faz chorar agradecida pela redenção, mergulhada na compreensão da Sua graça e partir para a ação impelida pela misericórdia? De que me serve uma teologia que não remove minhas entranhas de amor pelas criaturas que Ele fez, que não se compadece?

De que me serve uma teologia que não descola meu traseiro da minha suntuosa cátedra do "saber teológico" para me mover em direção ao outro? De que me serve uma teologia que sequer me impele a interceder pelas pessoas não alcançadas pela redenção do nosso Deus? Que teologia imprestável, esta! Inconcebível!

O texto de Hebreus 5 e 6 me chamou muito a atenção para estes aspectos.

Aqui vai uma pequena reflexão sobre alguns excertos dos dois capítulos:

Todo sacerdote é constituído nas coisas concernentes a Deus a favor dos homens ... e é capaz de condoer-se dos ignorantes e dos que erram, pois ele mesmo está rodeado de fraquezas... (Hb 5,1-2)

O teólogo é um sacerdote. Ele possui um conhecimento sobre Deus que foi desenvolvido por meio de suas reflexões e estudos e que tem que estar a serviço daqueles que não possuem este conhecimento. Longe de ser um conhecimento completo (até mesmo porque a quantidade de teólogos "perdidos" que destroem a fé ao invés de construí-la parece estar aumentando), ele também está em processo, mas precisa colocar seus processos a serviço do Reino, para exercer misericórdia e justiça nesta Terra. Colocar sua teologia a serviço do "Seja feita Tua vontade". Se meu conhecimento sobre Deus não promove este tipo de movimento, minha teologia é imprestável, inconcebível.

Jesus, nos dias de sua carne, tendo oferecido com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem podia livrar da morte, foi ouvido por causa de sua piedade. (Hb 5,7)

Não existiu teólogo mais excelente neste mundo do que o Senhor Jesus. Ele era isso tudo porque conhecia a Deus. Estou falando do Jesus humano, o verbo encarnado. Um ser humano como eu e como você. A questão é que a Teologia de Jesus era pró-ativa. Ele não apenas ensinava sobre o Reino, mas mostrava e concretizava o Reino em ações. Às vezes gastamos tanto tempo lendo e refletindo sobre os teólogos de toda a história, chegando ao cúmulo de ficarmos confusos com a profundidade de suas expressões teológicas, que esquecemos do Teólogo por Excelência: Jesus. Ele é, sempre, e acima de tudo, o exemplo a ser seguido. E ele intercedeu, e agiu! Por que eu tenho gastado tanto tempo discursando e não copiando seu jeito de fazer teologia?

Quando devíeis ser mestres, atendendo ao tempo decorrido, tendes novamente necessidade de que alguém vos ensine, de novo, quais são os princípios elementares dos oráculos de Deus, assim, vos tornastes como necessitados de leite, e não de alimento sólido. (Hb 5,12)

Quando li esta parte, pensei na minha biblioteca com milhares de títulos e mais o dobro disso na minha biblioteca digital.  "Vaidade das vaidades" como diz o Eclesiastes. Tanta leitura, tanto mestrado, tanta docência e sequer lembrava de orar pelos não alcançados. Nunca tive grandes dificuldade para manter a disciplina da prática devocional diária. Ler a Bíblia e orar é parte da minha essência, embora tenha conseguido, por muitas vezes, deixar de ler esta Bíblia e orar com perseverança por meses a fio. Mas "princípios elementares" como: "Deus amou o mundo", escapam tão facilmente das minhas prioridades! Como pode isso? Me senti uma imbecil cheia de diplomas de uma Teologia Imprestável!


Então fiz uma oração, e incluo nesta oração minhas centenas de amigos teólogos, que conheci nestes 20 anos de exercício como professora de teologia, que como eu, esqueceram que somos sacerdotes sobre o conhecimento de Deus, que nossa missão nesta terra é aproximar as pessoas de Deus, trazer as pessoas à Deus pela intercessão, é trabalhar para que "Venha o Teu Reino". Teólogos que, como eu, encontram todo tempo do mundo para priorizar a leitura dos textos acadêmicos, mas não encontram tempo para serem rasgados pela Palavra, diariamente, no cotidiano. E esta oração engloba alguns dos versículos seguintes do capítulo 6 de Hebreus.

Senhor,
Perdoa-me, ajuda-me!
Que sendo eu, supostamente uma "mestre", 
não tenha que voltar a beber leite.
Que teus princípios elementares nunca saiam das minhas prioridades.
Que as faculdades que o Senhor tem me presenteado 
para discernir o bem e o mal, sirvam para amadurecer minha fé em ti, 
e não para enfraquecê-la e ou enfraquecer a fé de meus irmãos.

Que a chuva que cai sobre esta terra, 
que é meu corpo, que é meu coração, possa,
ao receber tua bênção, produzir erva útil, 
 alimento para aqueles que a cultivam junto comigo,
Ao invés de espinheiros e cardos.

Pai, sei que tu não és injusto para esquecer 
do amor e do trabalho que temos feito em teu nome,
Mas perdoa todo desserviço que no exercício de nossa teologia
acabamos prestando ao Reino.
perdoa as muitas vezes em que, por meio de nossa dialética,
transferimos para nossos ouvintes nossas próprias crises e dúvidas
e ajudamos a destruir a fé de alguns,
Fé que muitas vezes foi construída com muito sacrifício.

Tem misericórdia de nós, Senhor amado. 
Perdoa-me, perdoa-nos.
Que o amor que temos por Ti
nos ajude a sermos diligentes até o fim,
e que tal diligência nos conduza à plena certeza 
daquilo que não podemos ver,
à esperança do nosso encontro contigo na sua vinda.
Ajuda-nos a fazer uma teologia relevante
Não nos permita interceder com uma teologia imprestável.

Amém.






Comentários

Olá prof.a Lilia!

Concordo com todo seu texto. Precisamos demonstrar mais com atos do que com palavras. Nossa pró-atividade deve ser em testificar nosso Deus a todo mundo, de todas as maneiras possíveis. Lembro-me de Charles Finney que a sua presença evocava um homem temente a Deus, que por onde passava muitos se convertiam a Cristo. Precisamos orar, precisamos sair das quatro paredes, de forma que a nossa presença possa influenciar a muitos a se converterem a Verdade do Evangelho!

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