Fogueiras da Inquisição novamente? Que coisa medieval!

Dois dias atrás tomei conhecimento, por meio de pastores e pastoras amigos/as, que há um texto circulando em capítulos regionais da Ordem dos Pastores Batistas do Brasil e dali disseminando para todo o Brasil Batista, distorcendo a verdade a respeito da minha empresa, da minha carreira acadêmica, da minha carreira teológica e da minha carreira ministerial.. As fogueiras da inquisição parecem estar sendo nutridas com muita lenha nos últimos dias. Até o "index librorum prohibitorum" parece estar sendo ressuscitado na atualidade. Que coisa medieval! Que coisa retrógrada! Que vergonha para batistas que sempre prezaram pela liberdade do indivíduo e pela decisão congregacional e democrática!

Eu, particularmente, nem teria me dado ao trabalho de retrucar porque entendo que o esforço emocional e cognitivo, além do tempo e da energia empregados não compensariam jamais. Tenho coisa muito mais útil a fazer com meu tempo do que responder certos setores da minha denominação que não apenas não entendem do que falam, como não querem entender. Já aprendi a deixá-los aos cuidados do Justo Juiz, lembrando sempre que o juízo de Yahweh começa pela sua própria casa, conforme a profecia de Amós. E entre cair na mão de STF, por exemplo e cair nas mãos do Deus Vivo, ah, sim! Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus que socorre a viúva e o órfão. Mas a pedido destes amigos é que escreverei este texto. Simplesmente porque os amo e os respeito.

Algumas pessoas que não tiveram acesso ao texto da OPBB me pediram que eu socializasse o conteúdo, e eu digo: desistam! Se vocês acham que eu mesma vou me emprestar para disseminar esse texto vergonhoso, podem desistir, porque isso não honra o nome do meu Senhor Jesus. Então vamos aos ajustes.

Essa é uma carta aberta a todo o povo batista brasileiro, principalmente aos seus pastores e líderes, inscritos ou não na OPBB. Peço que a difundam amplamente, por gentileza.

  • Realizo pesquisas sobre Estudos de Gênero desde 2000 e tenho esta carreira longa neste campo. O conhecimento que tenho adquirido com minhas pesquisas sempre socializei em seminários batistas ao longo de 18 anos de carreira e também em cursos customizados sobre o assunto que ministro por meio da minha empresa de Gestão do Conhecimento - a Eagle, espaço criado especificamente para promover diversos serviços, inclusive a educação bíblica que não é autorizada a ser ensinada em instituições confessionais por ameaçarem os poderes e poderosos que as controlam.
  • Meu trabalho não caracteriza NENHUMA  espécie de militância LGBT. Não participo de passeatas, paradas, nada que represente ativismo LGBT. Nunca participei. Sou uma cientista, uma pesquisadora, meu viés é profundamente acadêmico.Não estou associada a nenhum movimento ativista de inclusão LGBT. Entendo que meu trabalho consiste muito mais em trabalhar contra a exclusão, muito mais do que a favor da inclusão, porque no meu entendimento não significam, necessariamente, a mesma coisa.
  • Sou membro da  Comissão de Justiça Racial e de Gênero da Aliança Batista Mundial - BWA - para o quinquênio 2015-2020, e parte da minha atividade nesta organização é despertar o diálogo e articular caminhos de conciliação, gerenciando conflitos e multiplicando os facilitadores deste processo.
  • Meu ministério neste campo, há mais de treze anos consiste também de cuidar de pessoas gays, que querem seguir a Jesus, passam por crises de identidade extremas, muitos chegando à beira do suicídio, depressão etc, e não são pastoreados pelos cristãos porque grande parte destas igrejas está ocupada em demarcar território de controle e poder e não em cuidar. Gasta-se mais tempo formulando documentos de segregação do que cuidando de quem necessita.
  • Meu caminho sempre foi pioneiro, solitário, como João Batista no deserto, me custa um preço muito caro e é, acima de tudo, educacional, trabalha para mudança de modelos mentais. Atividade que requer uma enorme perícia e não conheço outra pessoa que faça isso no Brasil hoje, isto é, o "trabalho sujo" que a igreja não quer fazer, andar com os pecadores, trata-los como amigos, sentar à mesa com eles, enfim: parecer com Jesus, andar como Jesus andou e fazer o que ele fez.
  • Como educadora que sou, por mais de trinta anos tenho sido convidada para conferenciar em igrejas e organizações das mais diversas sobre inúmeros temas que perpassam a espiritualidade, exegese bíblica, missão, história da igreja, gestão de conflitos, educação cristã. Cada organização que me convida determina o tema sobre o qual devo conferenciar. Não chego nas igrejas ensinando o que "dá na telha", as comunidades são responsáveis pela escolha dos temas para os quais estão convidado-me para falar.
  • Dentro do escopo do meu trabalho está o treinamento e desenvolvimento de pessoas que queiram facilitar o diálogo e tratar a questão com amor cristão e misericordioso. E um dos meus primeiros passos é distinguir os termos como Educação sobre Gênero, teologia inclusiva, teologia queer, ideologia de gênero, para que todos saibam, com clareza, que meu trabalho é fazer Educação sobre Gênero. Nenhum dos outros três pontos fundamenta minha atuação.
  • Meu trânsito em igrejas inclusivas, além das inúmeras amizades que tenho feito entre eles é antigo, não é uma "onda" como disseram, nem um "entusiasmo". É minha carreira, pois faz parte do meu trabalho conviver com pessoas, ouvir suas histórias e compreender suas necessidades. Este trânsito em igrejas inclusivas acontece desde 2006.
  • Meus últimos 20 anos como cristã foram marcados como membro ativa e participante da liderança na educação das seguintes igrejas: Primeira Igreja Batista do Recreio dos Bandeirantes (2000-2007; 2011-2014), Igreja Batista Itacuruçá (2008-2010), Igreja Batista Memorial da Tijuca (2014-2017) e agora Igreja Batista Betânia. Meus pastores foram, respectivamente: Pr. Wander Ferreira Gomes, Pr. Israel Belo de Azevedo, Pr. Valdemar Figueredo, Pr. Luiz Roberto dos Santos e Pr. Neil Barreto (atual). Tenho orgulho de todo apoio ministerial que cada um deles tem dado à minha vida, reconhecendo a idoneidade do que faço e recomendando meu trabalho para inúmeros de seus conhecidos, inclusive convidando-me a integrar outros projetos que coordenam.
  • Profissionalmente, sou professora universitária, tendo atuado como docente na Universidade Federal do Rio de Janeiro desde 2014,  doutoranda em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia na mesma Universidade, Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, na área de exegese bíblica, Mestre em Teologia Bíblica, com ênfase em Antigo Testamento. Estudos de gênero, incluindo homossexualidade sempre estiveram presentes nos temas de minhas pesquisas stricto sensu e também na minha docência, Incluindo o STBSB e CIEM, instituições às quais estive vinculada num total de 11 anos. Os programas de disciplinas sempre foram examinados e aprovados pelos coordenadores e diretores destas instituições antes das disciplinas começarem a ser ministradas.



OUTROS ESCLARECIMENTOS IMPORTANTES
  • Igreja do Pinheiro - O autor anônimo do texto me inclui numa "onda inclusiva" de gente que começou a se manifestar dando apoio à Igreja Batista do Pinheiro por seu manifesto enviado ao Brasil em 2016. Nunca participei de qualquer ação manifestando apoio ou contrária ao Pinheiro por motivos de ordem pessoal que nada tem a ver com este texto.
  • Revista Novos Diálogos - Sou autora nesta revista desde 2008, quando foi fundada. O propósito da revista é mais antigo e muito mais amplo do que seus vínculos à questão do Pinheiro. Atualmente uma dúzia aproximadamente, de pastores e pensadores batistas são autores na revista. Tenho vários artigos sobre devoção e espiritualidade publicados  na revista e se não me falha a memória apenas um único fala do perigo desta ignorância que temos para tratar assuntos LGBT e da necessidade urgente de nos educarmos para começar a dialogar sobre o tema.
  • Livro Reimaginar Igreja: 40 vozes. Trata-se de uma coletânea celebrativa dos 500 anos da Reforma.  Um trabalho feito entre os editores e os autores da revista virtual ao longo de 4 anos, tendo como tema central a Quaresma e a atitude de contrição e humilhação que esta época deveria trazer ao coração dos cristãos em todo o mundo. Lembrando que o esforço da revista é ecumênico. Como autora na coletânea participei do sarau de lançamento no Rio de Janeiro. Há um artigo meu nesse livro falando de espiritualidade contemplativa e serviço, onde compartilho minhas experiências como voluntária na Cristolândia, projeto da JMN.
  • Festival Reimaginar - um esforço colaborativo com o EntreNós para trazer conferências de alguns dos autores da revista para repensar temas tensos no comportamento dos cristãos da atualidade. Nunca participei do festival, assim como diversos autores na Revista, por causa do perfil do Festival e do perfil dos escritores.
  • EntreNós - Organização ecumênica composta por pensadores e teólogos evangélicos da geração mais recente, que andam bastante incomodados e desconfortáveis com a forma como a religião tem ocupado lugar do verdadeiro cristianismo. Tive um único contato com esta organização no sarau de lançamento do livro Reimaginar, poucos meses atrás. Antes disso mal tinha ouvido falar.
  • Aliança de Batistas do Brasil - Não pertenço à organização, não sou associada. Não pretendo ser por motivos pessoais. ABB foi fundada em 2005 como organismo para agremiar  brasileiros batistas com visão e inserção ecumênica e trabalha com valores comuns a outros organismos ecumênicos. Não agrega igrejas, agrega pessoas. Sua filosofia de trabalho é claramente descrita em seu sítio na web: http://www.aliancadebatistasdobrasil.com/p/quem-somos.html . Sua filosofia de trabalho não é a que propagada no texto.
Nenhum destes organismos foi criado por causa, ou para causar uma "onda inclusiva". Eles são bem mais antigos que os movimentos de exclusão mais recentes promovidos pela CBB contra igrejas mais tolerantes com a questão homoafetiva. Se estes organismos se manifestaram apoiando a Igreja do Pinheiro, o fizeram por considerar um total disparate com os valores batistas a atitude do conselho da CBB. Sabemos também que esta decisão não foi tomada sem muitas rachaduras dentro da própria CBB. Prevaleceu uma minoria que decide, mas que não representa o pensamento do povo batista brasileiro, haja visto a quantidade de igrejas e pastores solidários ao Pinheiro. 

Vozes ferozes se levantam para distorcer, difamar e atingir pessoas e organizações nominalmente porque estão em crises internas. Quem não está em crise  não sente qualquer necessidade de atacar seus semelhantes. O ocorrido é muito triste, mas sobretudo é  anti-cristão, anti-bíblico e a Igreja Batista Brasileira, nos seus setores defensores da exclusão, há de ser julgada pelo Senhor Jesus por tais movimentos. O momento chegará.



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